quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Surrealismo


O aparecimento do surrealismo não pode dissociar-se da mudança de estruturas económicas e sociais, decorrentes sobretudo da 1ª Grande Guerra e da “Revolução de Outubro”, em 1917, na U.R.S.S., nem do agravamento de uma crise da valores que inclui o questionamento do pensamento discursivo e racional. Este movimento desejou revolucionar a vida através da arte, aceitando e alimentando as manifestações do inconsciente, da loucura, do desregramento dos sentidos, da anulação de fronteiras entre o sonho e a realidade.

Abordar o aparecimento e evolução do Surrealismo em Portugal implica, necessariamente, uma primeira referência ao movimento surrealista em França e o imediato registo da “décalage” cronológica entre as manifestações surrealistas em cada um dos países.

Alguns autores consideram que o seu aparecimento coincide, em linhas gerais, com o fim da primeira guerra mundial, e o desaparecimento com o desencadear da segunda. No entanto, o movimento não se pode delimitar entre as duas guerras, ainda que o ambiente posterior seja radicalmente diferente do de antes da guerra. Para além da estética e práticas surrealistas continuarem a estar na origem de várias manifestações artísticas, o grupo de artistas que se reúne à volta de Louis Aragon (depois do seu regresso do exílio, nos Estados Unidos da América, em 1947) só caminha para a dissolução com a morte deste, em 1966, e só em 1969 assume a sua auto-dissolução, através do artigo “le Quatrième Chant”, publicado no jornal Le Monde, a 4 de Outubro, e assinado por Jean Schuster.

Num breve percurso pela história do surrealismo em França, refira-se primeiro o movimento dada, fundado em 1916 por Tristan Tzara, que pôs em prática, a partir de 1919, uma das técnicas mais usadas, posteriormente, pelos surrealistas: a escrita automática. Tristan Tzara, nascido na Roménia, vai para Paris precisamente em 1919, onde é acolhido pelo grupo da revista Littérature, fundada nesse ano por André Breton, Louis Aragon e Philippe Soupault. Também Breton experimenta a escrita automática a partir de 1919, e escreve, com Philippe Soupault, Les Champs magnétiques.

Em 1922, Tristan Tzara rompe com André Breton e em 1924 surge “oficialmente” o Surrealismo, com o Manifeste du surréalisme, deste último. O vocábulo fora usado pela primeira vez por Guillaume Apollinaire, em 1918, ao qualificar o seu drama “les Mamelles de Tirésias”. A definição apresentada no Manifesto é a seguinte: “Automatismo psíquico pelo qual se pretende exprimir, verbalmente ou por escrito, ou de qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento. Ditado do pensamento, na ausência de qualquer vigilância exercida pela razão, para além de qualquer preocupação estética ou moral” (Breton, Manifestos do Surrealismo, Lisboa, Edições Salamandra, 1993,p.34). No entanto, os modos de expressão do surrealismo não se reduzirão ao procedimento da escrita automática. Apresentar-se-á como um movimento revolucionário, não reservado apenas à literatura mas será sobretudo a poesia o instrumento de Conhecimento tendo em vista a emancipação do homem.

Em 1929 surgirá o Second Manifeste du Surréalisme, também de Breton. Entretanto, várias divergências surgiram no grupo: em 1926, Aragon, Breton, Eluard, Péret e Pierre Unik excluiram Antonin Artaud e Philippe Soupault, por incompatibilidade de objectivos. Breton, juntamente com Eluard e Aragon aderiram ao Partido comunista, em 1927; mas em 1933 Breton e Eluard serão excluídos do Partido e depois da “Association des écrivains et artistes révolutionnaires”. Conflitos ideológicos afastarão alguns surrealistas do partido comunista.

Numa tentativa de sistematização dos aspectos mais importantes da escrita surrealista, poderemos indicar:

Actividade experimental na prática do automatismo e na prospecção dos estados segundos, através da escrita automática e do sono provocado ou hipnótico.

Preocupação em explorar o inconsciente

Prospecção sistemática dos sonhos, das coincidências, de fenómenos do acaso

Psicanálise

Inquéritos acerca da sexualidade e do amor

Actividade lúdica - sobretudo através de jogos, como o cadáver exquisito

Escrito e desenhado

Esoterismo e magia

Humor negro, cuja presença corrosiva é, por excelência,, o princípio de subversão da linguagem.

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